Maria Miguel Oliveira da Silva is currently a Ph.D. candidate in Law at NOVA School of Law. She is a researcher at NOVA Consumer Lab, NOVA Business, Human Rights and the Environment and at CEDIS – Centre for Research on Law and Society. She is also the author of a dozen published works on human rights, sustainability, consumer law, and criminal law.
No passado mês de outubro, a TotalEnergies foi condenada em Paris pelo caráter ilegal da promoção publicitária que fez das suas «políticas verdes»[1]. Este caso é expressivo no âmbito das práticas de greenwashing (maquilhagem verde) e pode vir a representar um ponto de viragem na forma como as práticas publicitárias ambientais são levadas a cabo pelas empresas.
Esta decisão surge na sequência de uma ação intentada em 2022 por organizações ambientais como a Greenpeace France, Les Amis de la Terre France e Notre Affaire à Tous, apoiada por diversas entidades da sociedade civil. O tribunal considerou que a TotalEnergies induziu o público em erro ao apresentar-se como «uma referência na transição energética», apesar de, na verdade, continuar a expandir os seus projetos de petróleo e gás em vários países e de produzir emissões de gases com feito de estufa superiores às de toda a França. A empresa afirmava colocar o «clima no centro da sua estratégia», prometendo energia «mais limpa, segura e acessível», e definindo como objetivo atingir a neutralidade carbónica até 2050.
O tribunal concluiu que estas mensagens criam uma perceção enganadora para os consumidores da TotalEnergies, já que afirma que é parte da solução para a crise climática, quando, na realidade, continua a investir fortemente em combustíveis fósseis (incluindo, dando início a novos projetos no Iraque, na Dinamarca, na Tanzânia e no Uganda). Este é o primeiro acórdão judicial que reconhece o caráter enganador da narrativa de «net zero emissions» da indústria petrolífera.
Na sequência da condenação, o tribunal ordenou à TotalEnergies a supressão imediata daquela publicidade e a publicação da decisão judicial no seu site durante 180 dias, sob pena de pagamento de 10.000 euros/dia em caso de incumprimento. Embora o tribunal não tenha analisado em detalhe outras campanhas publicitárias da mesma empresa (relacionadas, por exemplo, com biocombustíveis), por considerar que nesse caso não estariam em causa relações de consumo, esta condenação cria um precedente que poderá desencadear efeitos em cadeia noutras empresas e noutros países europeus, sobretudo naqueles em que as entidades reguladoras e fiscalizadoras da publicidade inspecionam práticas de greenwashing.
O conceito de greenwashing tem ganhado crescente relevância no Direito do Consumo e no Direito Ambiental. No âmbito do primeiro, e pensando no ordenamento jurídico português, a prática parece colidir com as disposições do diploma que regula as práticas comerciais desleais e também, de alguma forma, com o Código da Publicidade. O caso da TotalEnergies demonstra como a utilização de termos vagos como «transição energética» ou «neutralidade carbónica» pode distorcer a perceção dos consumidores e afetar a sua capacidade de tomar decisões informadas ou levá-los a tomar decisões que não tomariam de outra forma. As empresas não podem, sob o pretexto de comunicar sustentabilidade, redefinir conceitos científicos ou ocultar os impactos reais das suas atividades. Neste momento, encontra-se em discussão ao nível europeu a Green Claims Directive, relativa à fundamentação e à comunicação de alegações ambientais explícitas, precisamente visando, em parte, a aprovação de normas diretamente dirigidas às práticas de greenwashing.
A decisão francesa envia uma mensagem clara: a comunicação ambiental deve corresponder a compromissos reais e mensuráveis. Num momento em que os consumidores procuram cada vez mais bens e serviços sustentáveis, o recurso à publicidade «verde» tornou-se num poderoso instrumento de influência – e, por isso mesmo, um espaço de escrutínio jurídico.
O caso TotalEnergies ilustra que, num mercado cada vez mais atento à sustentabilidade, o Direito tem um papel essencial na garantia de que a confiança dos consumidores não é instrumentalizada e que a transição energética é, de facto, uma transição, e não apenas uma narrativa publicitária.
[1] Tribunal Judicial de Paris, 34.ª vara cível, n.º RG22/02955, n.º portalis 352J-W-B7G-CWJKL (sentença de 23.10.2025).
Suggested citation: M. Silva, ‘TotalEnergies condenada por prática de greenwashing: este é o primeiro dia do resto das nossas vidas?’, NOVA BHRE Blog, 14 November 2025
